segunda-feira, julho 17, 2006

Devaneio presunçoso 3

Homem aí do lado.
Continuação.

“O corpo endireitava-se, os pés procuravam a firmeza do solo, mas o velho, naquele instante, era só uma criança que acordava do susto de se imaginar indo ao chão.”

Nos passos seguintes evitou pensar sobre o que acontecera. Caminhou firme, olhos fixos. Há muitos anos não se permitira sonhar daquela forma. Não acreditava em sonhos porquê não concordava em ver o mundo pelo álcool da ilusão. Não permitir que nada se colocasse entre seu entendimento e o mundo real lhe garantia a certeza de fazer o que era certo. A plena consciência sobre a vida à sua volta lhe garantiram a posição atual.

Orgulhou-se de não ter condenado uma vida à existência humana e enquanto o fez, amaldiçoou os pais, velhos a quem abandonou enquanto era ainda jovem.

Precisamente, lembrou-se, quando terminou o ensino básico. Aos 15 anos juntou o dinheiro que havia ganho trabalhando na rua e sem sorriso ou lágrimas despediu-se dos limitados progenitores. Não haveriam glórias e acenos para um moleque que deixava tudo para trás. Enquanto o ônibus deixava a cidade, o coração, descompassado, pulsou pelo orgulho que lhe inundavam as veias. Olhos se fecharam, quando retornaram a abrir só puderam distinguir o mato que se alastrava entre as cidades. Naquele exato segundo percebeu que a diferença entre o passado e o futuro estava no breve abrir e fechar das pálpebras. Jurou pelo orgulho que lhe aquecia as mãos não mais se preocupar pelo que foi feito. Olharia fixo no passo seguinte, preocuparia sempre no segundo próximo.

Ainda não era capaz de devagar sobre a vida, sobre o que representava, mas entendeu, plenamente, que estava ali sozinho, fazendo a sua parte. Como uma pequena peça da grande máquina endireitou as costas, repousou a palma das mãos sobre as coxas e fez, matematicamente, o que deveria fazer. Esperou.

4 comentários:

Anônimo disse...

"Naquele exato segundo percebeu que a diferença entre o passado e o futuro estava no breve abrir e fechar das pálpebras."

Gostei muito desse trecho. Emocionou-me.

E depois que me recuperei, fiquei piscando um monte de vezes que nem uma boba enquanto pensava "passado. futuro. passado. futuro."

Vai entender...

Muito bom! Gostei do correr da história.

Anônimo disse...

Esperou. Esperou o que? Ah, pensei que fosse uma trilogia, mas acho que esse termo é restrito aos filmes... Se bem que não, existiu "Loucademia de Polícia 456.654" haha

Vc escreve mt bem! bjo

Unknown disse...

(Ha! Consegui! Foi só usar o mozilla e não o "Bill" Explorer!) Percebeu que além de criar um conto você criou uma futura citação? "Naquele exato segundo percebeu que a diferença entre o passado e o futuro estava no breve abrir e fechar das pálpebras" é o tipo do período que já nasce para ser citado!

Anônimo disse...

gostei mt dos últimos capítulos!é interessante observar como o homem sempre volta às suas origens, que mesmo fazendo parte de uma máquina maior que lhe suga a vida é capaz de se lembrar da infância com gosto e admirar a beleza do mundo.é um sinal de que há esperança,não?gosto de acreditar nisso.outro dia vi em um filme(an unfinish life) a sguinte frase quando um avô se referiu à neta de 10 anos:"ela etá na idade de achar que tudo ainda vai dar certo".gosto de pensar que ainda podemos voltar a esta idade. acho que seu personagem consegue isto
em alguns momentos.isso é bom!