terça-feira, dezembro 12, 2006

Transparência


Tem alguma coisa errada!

Vamos devagar, primeiro uma boa notícia. A Controladoria Geral da União acaba de disponibilizar na internet, o acesso gratuito e livre ao Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira). Isso quer dizer, na prática, que qualquer usuário poderá acessar os valores correspondentes aos gastos do governo nos anos de 2004, 2005 e 2006.

O site para acessar esses valores e entender, onde o governo gastou os 2,34 trilhões de reais do orçamento da união é: http://www.portaltransparencia.gov.br sob o link “Aplicações Diretas”.

Dando uma olhada rápida sobre essa ferramenta, pude observar algo com certeza chamaria a atenção de vocês. Sob o item “Principal Corrigido da Dívida Mobiliária Refinanciado”, que quer dizer nas palavras do próprio site, “Despesa Amortização e Juros da Dívida - Principal Corrigido da Dívida Mobiliária Refinanciado”, o governo gastou R$ 309.006.270.356,86 ou melhor metade dos seus exatos R$ 778.520.458.773,02.

Não farei nenhum comentário, mesmo porque o tópico é auto explicativo. Mas fica ai a sugestão para entrarem e darem uma olhada no site.

quarta-feira, dezembro 06, 2006

O homem santo


Um dia ele simplesmente ajoelhou em frente à igreja e rezou.

Rezou por seus pais, irmãos e pelos filhos que viram. Rezou pelos amigos e num instante dizia em voz baixa o nome de todos aqueles que um dia cruzou sua vida. E rezou por eles também.

Veio a primeira noite, o segundo dia. O sol levantava-se e punha-se enquanto sua única preocupação era não esquecer de ninguém que merecesse suas preces.

Antes do fim da primeira semana, o homem chamou a atenção da cidade. Muitos vinham para zombar, enquanto outros tentavam acompanhá-lo por algumas horas, antes de lembram-se de assistir ao capítulo da novela.

A primeira chuva caiu sobre a cidade com a força da uma provação divina. E ele passou.

Vendo-o atormentado pela chuva e sol que se seguiram em meses, a família e alguns amigos tentaram tirá-lo dali. Mas uma força misteriosa os afastava mesmo antes de tocarem no homem em vigília. Depois de duas comemorações do nascimento de cristo, o homem ainda era visto encurvado sobre o corpo, balançando a cabeça em movimentos retos como a de um pêndulo num balançar eterno.

A fama da reza espalhou-se no cerrado e muitos vieram vê-lo. Quando começaram a pedir-lhe graças, chamavam-no de santo. O nome pegou. Dali em diante a cidade teria um santo vivo. A prefeitura declarou festas em sua homenagem, o povo lhe dedicava romarias.

Mas o santo tinha como única preocupação rezar por aqueles que precisavam. Há muito já não mais sentia o próprio existir. O sol já lhe esquentava como a chuva não incomodava. Apesar das roupas envelhecidas e da pele suja pelos anos, um cheiro doce emanava de seu corpo. Não que percebesse. Mas o povo sentira.

Muitas descendências de animais correram até que um dia a precisão não o encontrou mais na igreja. Os mais aventurados ousaram dizer que havia subido em carne aos céus, prova do prodigioso dom dos homens santos. Mas estupefatos, tiveram de assumir o erro ao vê-lo caminhar novamente entre os homens. E apesar dos anos que se ele passou encurvado sobre o próprio corpo, nunca estivera tão altivo. Um olhar reinante que assustava os indecisos e acalmava os fiéis.

Aos poucos, a fama de santo se fez verdadeira, e muitos vieram pedir-lhe ajuda e conselhos. Mas foi quando o primeiro cedo voltou a enxergar e o primeiro leproso a caminhar, que a fama do homem de deus se espalhou pelas terras do condado.

Doentes e moribundos vinham de longe para serem vistos pelo santo e assim, como mágica, curados.

continua...

Sobre vida e morte


Nunca gostei daqueles mosquitinhos de banheiro. Eles são tão bobos.

Vocês já pararam pra pensar porque existem tanto deles? Você já tentou matar a todos e no dia seguinte descobriu que haviam mais, e mesmo após esse segundo extermínio, no próximo dia era como se eles estivessem todos ali de volta, reclamando uma vingança. Pois eu descobri de onde eles vêem, do ralo do banheiro. Mas não daquele debaixo do chuveiro (eles não sabem nadar), mas daquele outro, normalmente perto da privada.

Sem o mínimo apego e consternado pelo nojo daquelas patas que passaram pelos esgotos até chegar ali e pousar na minha toalha limpa, eu promovia diariamente um genocídio de mosquitinhos de banheiro.

Lembro que adorava prendê-los nas tampinhas descartáveis dos barbeadores do meu pai, só para ter ali, o poder supremo sobre a vida daquele ser tão execrável.

E nesses momentos eu parava por um instante e observava o que tinha em mãos. O controle sobre a vida e, portanto, sobre a morte deles. E um controle como esse, trás alguma responsabilidade.

Incentivado pela força criativa da água que escorria entre meus cabelos, eu parava, as vezes, para pensar como seria ter a escolha sobre a vida humana. Já imaginaram, uma legião de seres aparentemente semelhantes a você, mas submetido pelo seu poder esmagador e inabalável?

Ainda bem que não são muitos que têm esse tipo de poder. Acho até que a justiça nasceu justamente para impedir esse tipo de arbitrariedade.

A morte, para nosso senso de justiça, é a pior coisa ou a maior condenação que alguém pode sofrer, e não deve, portanto, ser decretada ou ordenada levianamente. A vida humana seria portanto um invólucro inquebrável. E cada ser é uma manifestação única desse direito.

Mas se a vida é assim tão preciosa, se mesmo os piores assassinos merecem um julgamento “justo” antes de terem suas vidas condenadas à morte; por que esse mesmo senso de justiça não pode ser estendido a um embrião? Por que uma sociedade que busca a justiça, não permite um que o acuso de viver (embrião) possa ter um julgamento? Como condenar alguém que não pode se quer se defender?!

Talvez argumentem, baseados na verdade da ciência, que aquele embrião não é, ainda, uma vida. Sua morte não significa perder um ser humano, mas sim dilacerar um incômodo apêndice daquela mulher que cometera o pecado da gravidez.

Mesmo que a ciência tenha suas fórmulas e números para prová-lo assim, a matemática também tem seus argumentos para mostrá-lo diferente. Naquela pequena bola celular está contida a expressão mágica da vida que irá, consecutivamente, executar os protocolos de crescimento, resultando no então cientificamente aprovado e socialmente aceitável ser humano. É como jogar uma bola de ferro para cima. Não é necessário vê-la cair para ter certeza que em alguns segundos ela encontrará o chão.

Outros falam ainda que a morte é melhor que a vida de privações e sofrimentos que aguarda, (ansiosamente acrescentariam), a vida daquela criança pobre, filha de pais pobres e neta de outros em situação semelhante. Mas quem somos nós para julgarmos?

E se mesmo assim o seja, a morte é ainda a melhor condenação para o pecado de querer nascer?

Uma sociedade movida pelo egoísmo enquanto sopra em hipocrisia as cornetas do altruísmo só pode mesmo é tomar medidas paliativas. Condene, esqueça, desligue-se, morra. Palavras tão duras aos ouvidos e tão comuns no dia-a-dia podre na existência cidadã.

Antes de agirmos de forma tão grosseira, deveríamos primeiro erguer as mãos e braços, trabalhando para que a criança seja recepcionada num mundo um pouco melhor.

Se me perguntarem o que eu penso sobre o aborto? Diria que trabalharia cada instante de minha vida, dedicaria cada segundo de existência antes de carregar comigo e para a eternidade a responsabilidade sobre a morte.