sexta-feira, janeiro 05, 2007

Mundos perfeitos

As pessoas sabem quando estão fazendo algo errado, ou melhor, algo que não deveriam estar fazendo. Errado, dizemos, quando somos os afetados, as inocentes vítimas do vilão nessa história em particular.

Um amigo meu sempre me contou sobre sua dificuldade em acordar todos os dias de manhã. Não necessariamente acordar, mas levantar-se da cama depois que o despertador já fez seu odioso trabalho (a propósito, quem foi o infeliz a inventar o despertador? Mas esse é um tema para outro post, em outro blog, é claro). E nesses minutos, que se estendem por horas, entre o acordar e levantar, ele sabe o que deve fazer, sabe que sua única função é erguer-se e começar o dia como uma pessoa decente. Mas por que fazê-lo ele pergunta? Por que levantar agora quando eu ainda tenho que salvar todos aqueles doentes ou ainda, pensar na sugestão para o próximo filme de David Richard Ellis.

E como acontece com ele, acontece com a maioria de nós, quero dizer, sabemos que estamos fazendo algo errado, mas nos dizemos isso o tempo todo. Ao contrário, criamos desculpas, imaginamos um mundo onde nossos erros se justificam e nesse momento, treinamos para um interrogatório imaginário, respondendo a perguntas absurdas, com respostas estúpidas.

Para que tudo isso? Já pararam pra pensar que fazemos isso até mesmo quando nosso erro vai, provavelmente, ficar eternamente guardado como um segredo. Imaginamos respostas para o caso de alguém vir a descobrir aquilo, mas já nesse momento sabemos que não podemos usar o tipo de argumentação que planejamos.

Mas retomo a pergunta: por que? Acho que a resposta é simples. Para a maioria das coisas que julgam moralmente errado ou eticamente inapropriado, nós não concordamos efetivamente, aceitamos o discurso e repassamos como foi feito por anos antes de nós. Isso, claro, para nos poupar o trabalho do ser o “do contra”, ou o “revoltado”. Mas temos plena consciência de uma voz que diz, “tudo bem, não é errado...”. E essa voz é o suficiente para nos convencer no âmbito da intimidade, mas não o necessário para manter a imagem perante os outros que tanto zelamos. Por isso, acredito, criamos os interrogatórios, para o caso de sermos pegos.

Deixo claro, entretanto, que não acho que meu próprio amigo vá esconder da sociedade seu pequeno probleminha de acordar tarde. Ainda não sou assim tão dramático. Mas é esse lidar com o erro e o errado que gera essas emoções tão engraçadas e de uma forma irônica, enigmáticas.

Sabemos que estamos errando, mas para esses momentos, podemos sempre nos esconder em nosso mundinho perfeito.

4 comentários:

Angélica disse...

Também tenho muito ódio de despertadores, mas mais ódio ainda de pessoas que resolvem me acordar quando não tinha nada combinado que exija que eu acorde. Principalmente porque isso acontece no melhor do sonho, na maioria das vezes.
Quanto à questão dos nossos defeitos, isso tem a ver com uma frase que regeu meu dia hoje: o importante não é não errar, é saber em quem botar a culpa.

Nana disse...

Às vezes o que julgamos em nosso íntimo (ou a sociedade e os entes queridos o fazem) como "erro" é na verdade o maior acerto, porque simplesmente é. Acontece... e pronto. Muitas vezes passamos grande parte de nossa vida tentando acertar, tentando ser algo que não somos... E isso é fazer o correto? Talvez sim, talvez não... vai saber!

Mas Thiago, não estou triste, não. Meus textos, em sua maioria, têm esse fundinho de tristeza... Herança de Vinícius de Moraes... hihihi

Sujeito Oculto disse...

Perfeito isso! Sim, ficamos repassando os interrogatórios estúpidos para caso sejam necessários e isso pode ser uma fonte de estresse permanente. Ultimamente, quando me pego fazendo isso, vem um foda-se enorme e esmaga tudo. E pronto! Não é uma maravilha?

Unknown disse...

Ok, isso me lembra a primeira vez que aluguei um vídeo pornô, a primeira vez que comprei curaçau, com 14 anos...Ok, isso me lembra muita coisa...Mas bem, a função da sociedade não é teoricamente manter todo mundo em uma constante situação de insatisfação controlada para que ninguém seja nem tão feliz que não precise mais dela e nem tão ferrado que resolva acabar com ela? Então, bem, tá funcionando pra mim...