quarta-feira, dezembro 06, 2006

O homem santo


Um dia ele simplesmente ajoelhou em frente à igreja e rezou.

Rezou por seus pais, irmãos e pelos filhos que viram. Rezou pelos amigos e num instante dizia em voz baixa o nome de todos aqueles que um dia cruzou sua vida. E rezou por eles também.

Veio a primeira noite, o segundo dia. O sol levantava-se e punha-se enquanto sua única preocupação era não esquecer de ninguém que merecesse suas preces.

Antes do fim da primeira semana, o homem chamou a atenção da cidade. Muitos vinham para zombar, enquanto outros tentavam acompanhá-lo por algumas horas, antes de lembram-se de assistir ao capítulo da novela.

A primeira chuva caiu sobre a cidade com a força da uma provação divina. E ele passou.

Vendo-o atormentado pela chuva e sol que se seguiram em meses, a família e alguns amigos tentaram tirá-lo dali. Mas uma força misteriosa os afastava mesmo antes de tocarem no homem em vigília. Depois de duas comemorações do nascimento de cristo, o homem ainda era visto encurvado sobre o corpo, balançando a cabeça em movimentos retos como a de um pêndulo num balançar eterno.

A fama da reza espalhou-se no cerrado e muitos vieram vê-lo. Quando começaram a pedir-lhe graças, chamavam-no de santo. O nome pegou. Dali em diante a cidade teria um santo vivo. A prefeitura declarou festas em sua homenagem, o povo lhe dedicava romarias.

Mas o santo tinha como única preocupação rezar por aqueles que precisavam. Há muito já não mais sentia o próprio existir. O sol já lhe esquentava como a chuva não incomodava. Apesar das roupas envelhecidas e da pele suja pelos anos, um cheiro doce emanava de seu corpo. Não que percebesse. Mas o povo sentira.

Muitas descendências de animais correram até que um dia a precisão não o encontrou mais na igreja. Os mais aventurados ousaram dizer que havia subido em carne aos céus, prova do prodigioso dom dos homens santos. Mas estupefatos, tiveram de assumir o erro ao vê-lo caminhar novamente entre os homens. E apesar dos anos que se ele passou encurvado sobre o próprio corpo, nunca estivera tão altivo. Um olhar reinante que assustava os indecisos e acalmava os fiéis.

Aos poucos, a fama de santo se fez verdadeira, e muitos vieram pedir-lhe ajuda e conselhos. Mas foi quando o primeiro cedo voltou a enxergar e o primeiro leproso a caminhar, que a fama do homem de deus se espalhou pelas terras do condado.

Doentes e moribundos vinham de longe para serem vistos pelo santo e assim, como mágica, curados.

continua...

2 comentários:

Angélica disse...

Sinceridade?
Nos dias de hoje, rezar pelo outro já é sinal de santidade!
Não sei se eu estou perdendo a crença no ser humano, ou se é ele que perde a capacidade de ser crível, mas penso que é cada vez mais raro o sentimento de amor ao próximo puro, desinteressado, e sem intenções de aparecer no Jornal Nacional ou participar de uma promoção de shopping.

Unknown disse...

Ninguém tem mais fé do que um cético...